Sequência da Pixar estreia quase 10 anos depois do primeiro filme, apresentando Riley mais velha e lidando com a chegada de novas emoções.
Há um paralelo muito interessante entre Divertida Mente e sua sequência, Divertida Mente 2, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, quase 10 anos depois do lançamento do primeiro filme.
Em 2015, antes da estreia de Divertida Mente, a criatividade da Pixar estava sendo posta em cheque depois que o período de sucesso com as histórias originais nos anos 2000, tidas como grandes clássicos do estúdio, foi seguido do foco em sequências como Toy Story 3, Carros 2 e Universidade Monstros, e de originais com pouco brilho, com Valente sendo recebido de forma morna e com O Bom Dinossauro adiado, por problemas nos bastidores. Nesse cenário, filme sobre as emoções de Riley foi a injeção de alegria e ânimo que o estúdio precisava.
Agora, em 2024 e prestes a retornar com a franquia Divertida Mente, a Pixar vê novamente sua criatividade questionada, depois de ter filmes originais despejados direto no Disney+ e com Elementos registrando a pior bilheteria de estreia da história do estúdio, no ano passado. O cenário parece o mesmo, mas a cobrança agora é bem mais injusta.
Essa resenha de Divertida Mente 2, um filme extraordinário e que de forma muito louvável consegue se colocar lado a lado do original, dispensa qualquer afirmação do tipo: "A Pixar está de volta!". Diferente do primeiro, esse longa não representa um divisor de águas para o estúdio (criativamente falando, não comercialmente). A Pixar tem consistentemente contado histórias originais empolgantes e com forte impacto emocional, da reflexão sobre o luto em Dois Irmãos, à aceitação da identidade em Luca.
Claro, você pode argumentar que esses e outros filmes recentes não estão à altura de Toy Story, Monstros S.A. ou Procurando Nemo, mas a Pixar também entregou longas como Soul e Red: Crescer é uma Fera, tão inventivos visualmente e profundos em suas discussões que não deixam nada a desejar em relação aos grandes clássicos do estúdio.
Dito tudo isso, Divertida Mente 2 é mais um ótimo filme do estúdio que dificilmente erra. Seu maior feito é conseguir se equiparar à excelência do primeiro filme, um dos melhores e mais originais trabalhos da Pixar, ao amadurecer suas discussões, explorar outros lugares na mente humana e representar a ansiedade de forma tão humana.
De volta à mente da Riley!
A premissa de Divertida Mente 2 é uma bem fácil de acompanhar. Riley cresceu e é oficialmente uma adolescente, e nova fase vem acompanhada das mudanças da puberdade. Na mente dela, onde estão Alegria, Raiva, Nojinho, Medo e Tristeza, essas mudanças se materializam na chegada de novas emoções: Ansiedade, Tédio, Vergonha e Inveja. Elas assumem o controle da mente e, logo em um fim de semana muito importante para Riley, isolam as demais emoções.
Narrativamente, Divertida Mente 2 repete bastante da estrutura do primeiro filme, com as emoções principais precisando encontrar um caminho de volta para a Sala de Comando antes que Riley tome decisões muito equivocadas e se arrependa depois. Mas ainda que o filme perca em originalidade (não há nada como a sensação do primeiro filme de ver a Alegria surgindo e de conhecer os lugares da mente), ele compensa no humor, na criatividade e, não ironicamente, na emoção.
Ao mostrar uma Riley mais velha, Divertida Mente 2 também se permite amadurecer com a personagem, e encontra muita força emocional aí. A Terra da Imaginação não é mais povoada por elementos infantis e as Ilhas de Personalidade não são mais suficientes para dar conta da pessoa multifacetada que ela está se tornando. Com isso, o Sistema de Convicções é sacada mais genial do filme, uma elaboração visual simples para algo tão complexo quanto as verdades em que acreditamos.
Com cordas que crescem a partir das memórias, as convicções são tudo que Riley acredita sobre ela mesma, e podem ser ouvidas na voz dela. Não só isso é utilizado de forma bem eficiente como ponto central na trama, mas a cena de apresentação do Senso de Si transborda aquela aura especial da Pixar.
Ansiedade é tudo
A melhor das adições de Divertida Mente 2 é, sem dúvidas, a Ansiedade. A personagem laranja com cara de desconforto resume com precisão a sensação de preocupação constante, o que deve ser um forte ponto de identificação com o público adulto. Ainda que muito do humor do filme venha do jeitinho meio maluco da personagem, está longe de ser uma representação que ignora o efeito negativo dela.
Na Ansiedade, Divertida Mente 2 encontra sua força emocional ao mostrar os danos quase irreparáveis da obsessão com o futuro e com aquilo que não podemos controlar, ainda que isso ironicamente fuja do nosso controle na maioria das vezes. É uma representação madura e forte, mas sobretudo humana, de como nossas emoções às vezes podem nos sobrecarregar.
No arremate, a sequência não consegue reproduzir o impacto emocional da reconciliação de Riley com os pais ao abraçar a Tristeza no primeiro filme, mas não por falta de tentativa. E chega muito perto.
Sentir todas as emoções
Divertida Mente 2 tinha a tarefa de fazer justiça a um dos melhores filmes da história da Pixar. Ao crescer com Riley e entender que a mente da garota é um lugar mais complexo, assim como ela, o estúdio entrega uma de suas melhores sequências ao discutir de forma muito madura os aspectos que nos fazem inteiros, os bons e os ruins, os que gostamos e aqueles dos quais não temos muito orgulho.
É um filme ainda mais engraçado que o primeiro, que não deixa a chegada das novas emoções tomar espaço dos personagens que já amamos. Inveja, Vergonha e Tédio têm seus momentos de destaque, mas Nojinho, Raiva, Tristeza e Alegria aprendem e ensinam novas lições valiosas sobre o que é ser humano.
Divertida Mente 2
Ano: 2024
Direção: Kelsey Mann
Elenco: Amy Poehler, Maya Hawke, Phyllis Smith, Lewis Black, Liza Lapira, Tony Hale, Ayo Edebiri, Paul Walter Hauser e Adele Exarchopoulos.
Pixar alcança o altíssimo nível emocional do primeiro filme ao amadurecer com Riley e abraçar as complexidades da garota.
Nota: 4.5/5
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